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Projeto de Lei e Norma Técnica do MPT retomam discussão sobre o Direito à Desconexão

Por Manuela Tucunduva

O direito à desconexão vem sendo discutido na doutrina e jurisprudência há quase duas décadas, porém, recentemente o tema ganhou maior destaque por conta da pandemia, que alterou de sobremaneira às relações de trabalho, instituindo o homeoffice e teletrabalho de forma massiva e, provavelmente, definitiva em diversos setores.

Basicamente, o direito à desconexão consiste na garantia do empregado de poder utilizar seu tempo, fora do horário regular de trabalho, para realização de atividades pessoais e familiares.

Os defensores dessa teoria definem à desconexão como um direito fundamental implícito, derivado da privacidade, do lazer, da saúde, da segurança e da dignidade humana.

Embasados em tais princípios, os Tribunais Pátrios – ainda que timidamente – têm, nos últimos anos, deferindo indenizações por danos existenciais, quando constatada situações extremadas de ofensa ao direito de desconexão.

Diante da ausência de lei específica regulamentando a questão, o senador Fabiano Contarato (Rede – ES) propôs recentemente o projeto de Lei 4.044/2020, que pretende inserir os artigos 65-A, 72-A e 133- A à CLT.

Em síntese, o texto determina que o empregado não pode ser acionado durante seus períodos de descanso, salvo em casos de necessidade imperiosa ou previsão em norma coletiva.

Prevê ainda que, durante o período de férias, o empregado deve ser excluído dos grupos de trabalho, bem como desinstalar do seu aparelho eletrônico privado todas as aplicações exclusivas da empresa. Regulamenta ainda que a ausência de resposta ao empregador – nesse período – não pode ser considerada como falta funcional.

Percebe-se, pela leitura da justificativa da proposta legislativa, que a intenção do senador é válida, na medida que visa preservar a saúde física e emocional dos trabalhadores, tolhendo abusos de direito por parte dos empregadores.

Porém, os artigos, tal qual foram redigidos, contrariam o senso comum de evolução tecnológica e ferem o direito à liberdade econômica.

Por óbvio, o acesso de forma eventual aos e-mails profissionais – ainda que no período de folga ou férias – não tem o condão de caracterizar trabalho de fato. Da mesma forma, pequenos diálogos em aplicativos de mensagens não significam disponibilidade ininterrupta ao empregador e nem sobreaviso.

Nesse sentido temos inclusive a Súmula 428 do TST que dispõe que “o uso de instrumentos telemáticos ou informatizados fornecidos pela empresa ao empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso”.

Proibir totalmente qualquer contato do empregador com o trabalhador durante suas folgas ou férias, não aparenta ser medida razoável, ainda mais no cenário tecnológico atual. Assim, espera-se que o projeto de lei não seja aprovado – ao menos sem emendas significativas no seu texto original.

Para fomentar ainda mais a discussão, em 10/09/2020, o Ministério Público do Trabalho publicou a nota técnica 17/2020 com diretrizes que devem ser observadas pelas empresas, sindicatos e órgãos da administração pública ao instituir o trabalho remoto ou homeoffice. Dentre as diretrizes apresentadas destaca-se a recomendação para a adoção de “etiqueta digital”, visando assegurar os repousos legais e o direito à desconexão.

A despeito da lacuna normativa regulamentando tal questão ou do entendimento do MPT, cabe reiterar a importância de uma boa gestão da qualidade vida dos trabalhadores também no ambiente extra laboral, tendo em vista que o Judiciário continuará avaliando e repelindo situações de evidente e extremo abuso de direito.